Coisa e Taous





Tanto fiz que consegui levar os meninos para dentro do quadrado do Templo Budista. Sonho antigo ser acolhida pelas largas asas de seus telhados. A aura de serenidade, leveza e pertencimento invade as almas assim que se adentra o solo sagrado da Terra Pura. 

Ainda não me tornei budista e nem pretendo me ancorar em qualquer doutrina religiosa por enquanto. Também não incito meus filhos a tomar tal atitude. Deixo que eles sigam seus corações. Mas o templo budista não é apenas para os convictos. Ele abraça os que são ávidos pela paz de espírito em suas várias facetas de comunhão: aulas de japonês, meditação cantada, artes marciais, yoga, quermesses, cursos de Ikebana... 

Então os guris estão disfrutando dessas bênçãos nas práticas de Kung Fu. E para a mãe sobra lascas de bem-aventuranças quando leva os rebentos e absorve a energia dadivosa circulando entre as os frequentadores nas quatro aulas simultâneas, compartilhadas pelas turmas e mestres num único e imenso tatame. A coletividade acontecendo em harmonia de propósitos. 

O mestre do Kung Fu é daqueles vocacionados. Dá para sentir a alegria emanada dele em meio à garotada. Everton é firme, exigente e arranca choro e suor dos aprendizes. Mas a lição acontece numa atmosfera de pura diversão. É uma farra séria. Assisto a tudo com uma ponta de orgulho: meus filhos estão curtindo o desafio e, sem que percebam, estão recebendo as benesses desse lugar espiritual poderoso. 

Ontem resolvi decifrar a curiosidade com o nome estampado atrás das camisetas dos praticantes da mais bela das artes marciais (que me perdoem os fãs do judô e karatê): TAOLU. Achei muito auspicioso, claro. TAO+LU, o caminho da Lu! 

Chamei o mestre à beira do tatame e perguntei. Ele prontamente explicou que Wushu Taolu é a parte de rotinas do Kung Fu. O Taolu é arte e esporte com regras de competição, formado por lutas coreografadas nas quais o atleta não tem adversário. Trabalha com as mãos livres ou armas,  tais como bastão, facão, espada e lança. 

Aí chegou a minha vez de lhe ofertar novidades: - E você conhece o Tau? Eu pensei que esse nome estampado na camiseta tinha a ver com o Tau (sem me tocar que um verbete terminava com O e o outro com U). O Tau é uma letra grega, um T que algumas pessoas usam penduradas no pescoço, já viu? 

Não, ele nunca tinha ouvido falar e começou a anotar sobre o assunto na contracapa do livro que tinha na mochila: a história do homem mais rápido do mundo, Usain Bolt. 

Há certos sinais que revelam uma escolha de vida. O Tau, um dos mais famosos símbolos franciscanos, hoje está presente no peito das pessoas num cordão, broche; enfeitando paredes ou estampado em pôsteres e quadros. Que escolha de vida revela o Tau, símbolo antigo, misterioso e vital que recorda tempo e eternidade? Arrisco a perene busca do humano pelo divino. 

Recordo que trouxe um desses cordões do Tau para Tomás da minha passagem por Santiago de Compostela. Ele era ainda muito novo para sacar a simbologia profunda daquele presente. Adorou apenas a grande letra T de seu nome. Falando do assunto com o professor de Kung Fu, vi outra conexão telúrica: a ideia de fazer a caminhada no segundo semestre desse ano e estar lendo tudo sobre o assunto. 

O Tau é a última letra do alfabeto judaico e a décima nona letra do alfabeto grego. Não está aí por acaso. Um código de linguagem reflete a vivência das palavras. É a procura da transcendência. Ainda que seja a transcendência de uma mãetorista que não está achando mais tão sofrido fazer com os filhos o trajeto da evolução. 



Comentários

  1. A vida é isso quanto mais cedo eles descobrirem, mais tempo eles terão para serem felizes.

    Renata Assumpção

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