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Mostrando postagens de agosto, 2012

O lado zen da fobia

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É chato quando a gente sofre de um temor sem explicação. Fico imaginando quem é realmente fóbico (será que eu sou e ainda nem percebi) e o medo paralisante guia a vida, ou melhor, limita a vida. Outro dia, zapeando os canais pagos, vi um pedaço de um programa sobre fobias que mostrava a parte final de um tratamento de dessensibilização envolvendo uma jovem com pavor de rãs e sapos. Ela tinha de passar a mão em sapos e rãs de borracha quase vivos de tão bem feitos. Provação absoluta. O ímpeto inicial foi de rir, achar ridículo. Como assim, medinho de rã e sapos? Mas o mesmo ela pode dizer de mim: como assim, horror de viajar de avião? Então no meu eterno tratamento de choque, eu entro no avião e viajo, pronto. Porém confesso que está cada dia mais difícil manter o espírito viajador com este fantasma que veio sei lá de onde e se instalou ao meu lado. Sombrio. E ontem eu me peguei separando os amuletos que me farão não entrar em pânico completo dentro do avião sozinh

A chave do sucesso

Pobre do meu blog que anda tão desamparado. E com ele, os meus leitores, aqueles que me dão a graça do tempo dispensado e o prazer supremo dos comentários. Porque hoje em dia, com essa loucura toda, alguém parar para ler um texto da gente - e ainda se dar ao trabalho de comentar - é pura poesia. Minha vida virou de ponta à cabeça. Parece que meu destino, além de pecar, é viver intensamente, nunca rendida a tal rotina por tempo demais. Entretanto sair da zona de conforto, mesmo quando ela não é lá tão confortável, dá certo trabalho e medo, não é verdade? Porque o comodismo, sem muito esforço, cria raízes e frutifica sua sonolência. Há 16 anos eu fazia praticamente tudo igual no STJ. Não porque eu quisesse, imagina, mas porque a dinâmica no serviço público é, geralmente, uma não-dinâmica. Bem que eu tentei por todos esses longos invernos e primaveras sacudir a poeira e dar a volta por cima. Algumas vezes consegui fôlego extra, noutras, morri na praia. Eis que de repente (e por ob

Scarlett

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Catarina sempre foi chamada de rebelde. Caçula, evitava seguir as trilhas deixadas pelos dois irmãos mais velhos. O comportamento fora do padrão multiplicava o trabalho dos pais. “Será que essa menina quer tudo diferente? Por que ela não pode ser como todo mundo?” Mas Catarina não era. Não ouvia frases feitas sem questionar. Não aceitava valores morais que não compreendia. E queria saber, queria explicações. "Puxa, pensar desigual é tão complicado! Que bom se eu pudesse entrar pelas mesmas portas e passear pelos mesmos jardins!"  Então Catarina percebeu que seus pais nunca deixariam de tentar moldá-la na simplicidade. "Para eles serei eternamente rebelde", concluiu com certo alívio.  Depois de refletir, resolveu ganhar o próprio dinheiro, pagar suas contas e não dar satisfações. "Assim ninguém me diz o que fazer e o que não fazer".  Pobre Catarina, estava tão enganada... Logo nos primeiros meses no escritório descobriu quanto

Luz acesa, janela fechada

Imagina o que é dormir tantos meninos diferentes num mesmo quarto... Pois era assim que meus amigos e eu costumávamos fazer. Todos queriam ficar num quarto só. Não porque a casa da fazenda fosse muito pequena. São quatro quartos, uma sala espaçosa na parte de cima. Descendo as escadas de madeira, estão a cozinha e o banheiro. Mas a gente quando é criança não quer saber dessas coisas não. Que graça tem ficar cada um num canto? E o caos? Geralmente a gente ficava no quarto do meio. Era uma cama de casal e um beliche, mais um armário e uma arca. Tudo bem antigo, com cara de casa de vó. Caber todos no mesmo cômodo era um desafio. O quebra-cabeça começava: – Bila, eu e Dedéia vamos dormir na cama de casal. Márcia e Kédyma na parte debaixo do beliche e Cacau e Marco Antônio na parte de cima. Ih, mas aí não cabem a Patty, Dri e Lígia, calculava eu, a dona da casa e, desse modo, quem decidia questões mais delicadas como quem vai tomar banho primeiro ou quem dorme em qual cama.

Trilha de cinema

Ninguém parava quieto na fazenda. A gente inventava moda o tempo todo, criando novas aventuras. Tanto que andamos no mato! Tanto tombo de cavalo! Tanto banho de rio! Tantos carrapatos grudados no sovaco, barriga, atrás da orelha...  – Vamos fazer uma excursão pelo córrego até chegar na cachoeira?, propus. A Salta Pau era joia! As terras ofertavam vários riachinhos, o rio Corumbá, diversas quedas d’água. Uma terra molhada, cheia de natureza bonita para aproveitar. O córrego que eu queria explorar ficava numa das divisas da gleba que terminava em uma cachoeira escondida, onde o sol nunca batia. Fria!!! Ui!!!  – Mas não é a mesma cachoeira que a gente vai sempre não, expliquei para minha velha turma de amigos do Notre Dame. – E existe outra por aqui? – Tem sim, Cacau. Uma bem mais longe, lá perto da fazenda do Davi (Davi era o fazendeiro vizinho). – Ah, mas a gente vai ter que andar muito..., resmungou, com preguiça, Lígia. – Que nada! Vai ser o maior barato

Histórias do breu

Programa da noite na fazenda era tomar banho, forrar a barriga com uma boa comida feita pela mamãe no fogão à lenha e correr para as redes da varanda da velha casa. Limpinhos, meus amigos e eu nos aninhávamos para evitar o frio que sempre vem quando se está no meio do mato. As histórias de terror começavam. Cada um tinha um caso sobrenatural para contar. – E aquela da mulher que morreu quando o carro caiu no despenhadeiro, mas voltou para a estrada para avisar do acidente?, disparava Marco Antônio. – Cruzes!!, encolhia-se Lara. – Mas por que ela voltava?, eu queria saber. – Porque seu filho estava vivo no carro e ela queria que algum motorista ajudasse a socorrê-lo. – Nossa! Que coisa! Será que foi verdade mesmo?, desconfiou Dri. – Quem te contou essa história?, perguntou Dedéia. – Ah, foi o Peba lá no Notre Dame, respondeu o contador. – Xiii... o Peba é o maior mentiroso da sala!!, lembrou Bila. E assim acabava uma e começava outra. Não sei por q

Intensivão

Volto para casa querendo sofá depois de mais uma jornada de trabalho. As Olimpíadas são a desculpa ideal para me jogar na frente da TV e curtir qualquer esporte que esteja rolando. Se for Brasil, ótimo, mas qualquer superação me fascina.  Curto esporte desde pequena. Influência do irmão Eduardo, um atleta inquieto. Praticou saltos ornamentais, remo, futebol de salão, tênis, sem falar na boa e velha pelada disputada toda semana com os amigos da quadra (de jogos e da vida, pois em Brasília chamamos de quadra um conjunto de residências). Edu também teve uma bicicleta esperta, daquelas primeiras com 18 marchas... Ou seja: ele era uma inspiração para a caçula que começava a dar seus saltinhos no balé. Entre as minhas doces recordações fraternais está assistir às partidas dos Grand Slams na espremida sala de TV da grande família ao lado de Eduardo. Nosso lar era um cortiço divertido e maluco que cabia, no máximo, quatro, mas onde se acotovelavam oito. Mas as agruras do cotidiano

Prelúdio

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Eu era uma menina que prestava atenção em nomes. Não pela tradição ou status que, por ventura, eles contivessem, mas pela beleza da sonoridade, das combinações. Júlia Beckman Meireles, Elion da Mata Ferreira, Lara Maria Albuquerque e Silva, Marco Antônio Mendes de Moraes, Helana Souza e Silva, Vanessa Demenjour Santos, Cláudio Dorça Stacciarini, Patrícia Franco Rodrigues... Nomes da lista de chamada que eu carrego no bolso da memória. É que desde muito cedo eu sabia o que era a orfandade de pai e de sobrenomes. Alcunhas se entrelaçando umas nas outras. Enleios... Antônio Dorça Stacciarini. O menino mais bonito da minha infância. Meu vizinho, irmão do colega de sala, Cláudio, e de Clari e Taísa, "os filhotes de anu". Era assim que minha mãe se referia aos quatro filhos de dona Maria Inês porque eles eram muito brancos, penugens. Entretanto, a curuminha aqui encontrava a tribo ideal naquela casa da esquina, espaço lúdico, desenfreado para a livre expressão.

Chapéu do Sol

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A historinha abaixo foi inspirada no fascínio dos meus sobrinhos pelos jacarés. Um fascínio que sempre me espantou. Afinal, que bicho mais idiota, não? Passa a maior parte do tempo parado como se fosse uma estátua... Mas percebo que há algo de nobre e terrivelmente assustador nesta imobilidade. E é isso que vai continuar fascinando os garotos - principalmente eles - por gerações e gerações. Para Daniel, Bruno e Diego, a primeira geração apaixonada por jacarés. E também para Tomás e Rômulo, a segunda geração que continua apaixonada por jacarés. O jacaré papo-amarelo vive de papo para o ar. Junto com seus companheiros répteis, as aves e outros bichos de diferentes espécies, jacaré papo-amarelo mora na borda do rio Água Limpa, na mata Chapéu do Sol. Ali, árvores altas, muito compridas mesmo, fazem uma grande sombra em forma de chapéu (amassado, é verdade) sobre a clareira quando é três da tarde. Voltando ao jacaré papo amarelo, lá está ele, deitado, só curtindo o sol