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Mostrando postagens de novembro, 2010

Orgulho de ser "castanha"

Dois acontecimentos culturais me chamaram a atenção por suas motivações diametralmente opostas. Quase distraída e, por isso, em cima da hora, consegui os últimos ingressos extras para assistir ao show da Rita Ribeiro no sábado que passou. Arrastei comigo minha irmã mais velha, a Nena, não afeita às baladas e um tanto enferrujada quanto às novidades da cena musical. Mas ninguém podia ficar indiferente àquela deusa elétrica derramando talento performático. Encarnando de Iansã a Ogum, o palco do Teatro Oi virou terreiro de todos os orixás. A casa tremeu com as bênçãos de Jorge. Esqueçam os lugares marcados! Todo mundo caiu na dança do espetáculo Tecnomacumba. Uma mistura frenética do batuque afro e sua espiritualidade com a pegada “roquenrrol”. Transe absoluto. Minha irmã se deixou levar pelos tremeliques de corpo. Levantou da cadeira e sacudiu a poeira. Apaixonou-se por Rita Rainha dos Raios. Que muito lembrou outra deusa: Clara Nunes. Taí um trabalho de profundo respeito à nossa a

Os fins justificam os meios

Quanto vale um sonho de criança? Se a Mastercard roubar minha ideia, vai saber que não tem preço. Mas não é bem verdade. Porque um montão de meninos e meninas do Brasil está à espera de que suas cartinhas para o Papai Noel sejam atendidas. Meus filhos estão, então intuo que os outros filhos também aguardem ansiosos que suas bicicletas, patins, laptops da Xuxa, helicópteros do Ben 10 e demais desejos se materializem. Todos os dias, a gurizada sofre um bombardeio sem trégua de comerciais apetitosos. Filho de pobre, filho de rico. Miséria é miséria em qualquer canto e a imaginação infantil também. Acabei de pegar dezenas de sonhos de crianças em minhas mãos. Estava em meu poder deixar o Natal de um guri ou guria mais bonito. Geanne, Alexandre, Ingride, Hugo, Marcelli e tantas outras letrinhas cheias de garranchos abrindo o coração para o Papai Noel em desenhos ou frases. Deu pra sentir uma certa orquestração naquelas cartinhas. Talvez eles até já saibam que o Papai Noel é só uma

Presente

“Tem hora que a gente fica distraído olhando para o ontem...” O achado poético saiu da boca do meu tourinho de seis anos. Estava eu perguntando algo para ele dentro do carro. Ele não respondeu e retruquei: “Tomás, estou falando com você!!” A resposta veio certeira em forma de poema. É, há dias em que a gente está distraída, olhando para o ontem... E no ontem tem a minha mãe sorrindo, a gente morando na casa do Lago, um quarto pequenininho, apertadinho, com varanda exclusiva só para mim. No ontem tem meus passeios avoados de bicicleta; sem medo de cair e quebrar o cotovelo. Ontem também estou com a amiga Patty indo ao cinema no cine Atlântida. Visto uma blusa-sanfona com estampa de morangos. Dezenas de morangos no fundo branco. Um garoto passa e mexe com as duas meninas leves: “Hum, vontade de tomar sorvete vermelho.” E não é que ontem vejo meu nome na lista de aprovados do vestibular da UnB e saio gritando pela rua: passei! Passei! Ainda ontem quebrei a cabeça para escol

Eletrochoque emocional

Li numa materinha do “O Globo” que conversar com as amigas sobre os problemas deixam as mulheres ainda mais tristes e ansiosas. Então, F.!!! Se a gente não pode nem desabafar com as mulherzinhas sobre as angústias da feminilidade, não existe salvação para a espécie.Vamos todas coçar o saco, jogar sinuca e sair na porrada por causa do futebol. Desconfio que essa pesquisa foi encomendada pelos terapeutas e psicanalistas. Com as amigas não pode, mas e com o psicólogo? Fiz terapia durante um tempo e agora estou voltando ao divã, aliás, à poltrona. Mas sempre me pego pensando no porquê de pagar tanto para alguém ouvir nossas neuras se aquela amizade de infância pode ter a mesma serventia... Quem sabe é para a gente deixar de ser uma mala pesada com as coitadas que nos acompanham. Amiga é pra todas as horas, mas-que-tal-esquecer-meu-telefone-hoje-que-não-tô-afim-de-ouvir-choradeira? Brincadeiras à parte, eu queria mesmo acreditar nesse papo de terapia do fundo do meu coração. Apostar tod

Não vá antes do almoço

Eu sempre achei que queria participar de uma autópsia. Ok, mais uma das minhas lúgubres, sórdidas e sombrias esquisitices. De uma menina que praticamente aprendeu a ler nas páginas policiais dos jornais e que gostava de jogar Detetive tanto quanto gostava de boneca. E que continua paralisada em frente às séries de investigação que, para a sorte desta mentia doentia, se multiplicam na TV a cabo. Mas a exposição "Corpos" veio para derrubar o mito. O mito de que eu realmente gosto de sangue, vísceras e ossos expostos. A percepção do meu lado Hyde agora se divide entre antes e depois de "Corpos", pois gosto é da estética mórbida envolvida nas histórias de vampiros, lobisomens e seres torturados em geral. Tudo de longe, como boa expectadora. De perto, ninguém é normal mesmo e eu não quero ter nada a ver com isso. Mal conseguia olhar aqueles esqueletos de verdade cobertos de músculos, peles e órgãos. Aquilo ficou um dedinho assim da completa repulsa. Os membros separa

Ecumênica

A amiga Evelyn me pede que escreva sobre a minha experiência no templo budista aqui no blog. A verdade é que eu não me sinto legitimada a escrever sobre esse assunto. Eu sou apenas uma participante da meditação cantada. Não sou budista, não pretendo me converter ao budismo, pelo menos por enquanto. Quem me levou ao Templo Shin Budista da Terra Pura pela primeira vez foi outra amiga, a Isabel. Mas eu já rondava aquele lugar desde a adolescência. Não perdia nunca a quermesse do mês de agosto, que acontece ao redor daquele lugar misterioso, destoante da paisagem concreta moderna do Plano Piloto. Um pedaço nipônico em pleno Planalto Central. Acreditava, naquela época, que o lugar era reservado apenas para japoneses ou descendentes de. Mas não perdia a oportunidade de mergulhar naquele mundo diferente do meu, seguindo os passos da dança-da-colheita-do-arroz. Os quimonos tão expressivos, femininos. A delicadeza dos gestos e dos rituais. Adoro um ritual, é verdade! Bem que tentei virar an

"A linda rosa juvenil"

Um cara toca e canta Djavan ao violão sentado no murinho. Mais à frente, o menino de tênis all star e bermuda larga sopra seu trompete. O som melodioso varando as ondas invisíveis do espaço. Lá dentro do auditório, o rapaz tímido, empunhando baquetas diversas, tira música inusitada dos instrumentos de percussão. Esse lugar de encantamento musical existe. É a Escola de Música de Brasília (EMB). Durante anos da minha infância eu convivi com a atmosfera dissonante da EMB. Vanja, minha irmã, foi aluna da instituição. De lá, saiu tocando clarineta e flauta transversal. E eu saí apaixonada por música. Agora que voltei a frequentar a EMB por causa da sobrinha do meu marido, que já se formou no básico de harpa -- imaginem vocês, harpa -- é que percebo uma simplicidade: a EMB deve ser responsável por todo o amor que sinto por esse universo. Cruzar aqueles corredores que exalam tons e sustenidos é um privilégio aberto à população de Brasília, pois a EMB é uma instituição pública. Ali, desco

Insônia de primeira

Dois dias sem nada novo no blog. Hora de escrever alguma coisa, qualquer coisa. Eu vejo por aí que os blogueiros seguem mesmo essa premissa: é preciso postar algo diariamente para manter o blog sempre atualizado. Caso contrário, as pessoas param de acessar. Mas eu fico aqui pensando... Não sei escrever assim duas linhas e achar que isso pode ser interessante para alguém. Mas também não dá para escrever textos legais todos os dias. Como diz a sábia Lya Luft, tem manhã que a gente "acorda burra" e não sai nada da cachola. Então, vamos de cinema! Tema que é sempre é uma saída para a falta de assunto. :) Assisti, enfim, ao megablockbuster nacional "Tropa de Elite 2". O cinema estava até vazio, tranquilo, contrastando com aquela fúria de filas que assaltou os shoppings do país na semana de estreia. Gostei da continuação, porém, como costuma caber às continuações, esse longa não teve o impacto e a qualidade do primeiro. Capitão Nascimento é personagem mais vigoroso do

Finadas histórias

O dia dos mortos já passou, o das bruxas (e há quem brigue também para que seja o do saci) também já se foi. Interessante ser uma data pertinho da outra, interligando a gente com as coisas do além. Um portal para o desconhecido deve se abrir entre o 31 de outubro e dois de novembro. Forças muito poderosas pairam sobre nós. Não do mal, não senhor. Do que transcende, apenas. Eu curto refletir e celebrar esse mundo sobrenatural. Sempre tive meu lado sombrio e, nesse ponto, me considero totalmente “americanizada”. Acho o halloween divertidíssimo com suas assombrações e abóboras desdentadas macabras. Ter meninos nessa hora ajuda bastante. Os dois pegam o embalo comigo, aceitam ser pintados de fantasma e caveira e vão para baixo do bloco no maior entusiasmo espectral. Fazer turismo em cemitério: tem gente que passa longe. Eu passo dentro. Há muita beleza estética guardada em alguns mausoléus. Esculturas de anjos, crianças dormindo, santos... Gatos (os seres enigmáticos por excelência)

Autógrafo às seis e meia

Deixa eu lhe dar um beijo, conhecer sua letra. Quando toquei em suas mãos, experimentei a fortaleza. Ainda bem que pude confessar: sua poesia me comove! E não tive medo de ser óbvia e de chorar. (De mim para Adélia Prado em priscas eras) Mágicas e insondáveis são as conexões telúricas da vida. A frase saiu assim, sinto muito. Não estou chapada nem nada. Essas ondas nunca fizeram a minha cabeça, mas acho que bons poemas são capazes de me deixar em transe, viajandona. E nesses dias passados estou mais Adélia Prado do que nunca, pensando nela muito e muito desde quarta-feira. O marco das tais conexões telúricas, que são aquelas raias espectrais que a gente pode observar nos astros de algum ponto daqui da Terra, foi esse dia, o dia 27 de outubro. Data em que uma conspiração do tal destino me colocou, depois de muito tempo, em rota de esbarrão com a Adélia. Acho que vi milhões de halos como entorpecida por LSD. Tudo começou “demanhãzinha”, quando me lembrei de um poema dela: "Minh

O Velhinho e a Aeromoça

Eis o último texto da saga "Portugal". Espero que tenham gostado das minhas peripécias lusas e que eu faça outra viagem que renda tantas ideias como essa me proporcionou. Curtam o feriado e inté! O Velhinho e a Aeromoça Que massada é viajar de avião! Da tecnologia espero apenas que um dia a gente possa se teletransportar. É pedir muito? A comissária de bordo portuguesa passa com cara de parede e voz de gravação a recolher os fones de ouvido. Em poucos minutos estaremos em Brasília. Coisa estranha essa de estar em outro hemisfério em tão pouco tempo. -Fones de ouvido, por favor... O senhor septuagenário vê naquele grande saco plástico aberto ao seu lado a oportunidade de se livrar de todos os dejetos produzidos durante a travessia do Atlântico. - Lixo não, senhor. Eu disse fones de ouvido. O lixo o senhor pode deixar no compartimento à frente da sua poltrona. O senhor tem fones de ouvido?, refaz a pergunta automática a autômata aeromoça. Se eu tivesse um trabalho